Economia

Governo faz balanço dos prejuízos do Paraná com privatização do Banestado
07-02-2006 22:10

A questão da transferência das contas públicas do Banco Itaú para o Banco do Brasil e os detalhes envolvendo a privatização do Banestado foram temas da reunião semanal da Escola de Governo desta terça-feira, no auditório do Museu Oscar Niemeyer, comandada pelo governador Roberto Requião. O secretário do Planejamento e Coordenação Geral, Reinhold Stephanes, e o procurador-geral do Estado, Sérgio Botto de Lacerda, foram os expositores.

Ao abrir o encontro, o governador Requião lembrou que durante o processo de privatização dos bancos públicos, o então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, editou uma Medida Provisória pela qual autorizava que nos leilões de privatização a gestão das contas públicas fosse transferida para os bancos vencedores por um período de cinco anos. A MP contrariava a Constituição Federal, que determina que somente os bancos públicos podem gerir as contas da União, estados e municípios.

Contrato - No entanto, em outubro de 2002, quando a eleição do atual governador já estava definida, o então governador Jaime Lerner assinou um acordo com o Itaú, prorrogando o contrato por mais cinco anos, mesmo faltando quase três anos para o fim da vigência do primeiro contrato. Com isso, o Itaú conseguiu assegurar o contrato por oito anos.

De acordo com Requião, além de comprar o Banestado por um valor abaixo do real, o Itaú ficou com um patrimônio extremamente rentável, que é a gestão das contas dos servidores. “Bancos privados ofereceram R$ 1 bilhão para administrar essas contas e o Itaú as obteve por R$ 80 milhões”, denunciou.

Para evitar polêmica, o atual governo resolveu esperar que vencessem os cinco anos iniciais e depois declarou a nulidade da prorrogação por mais cinco anos, transferindo as contas do Governo do Estado para o Banco do Brasil. A retaliação do Itaú foi imediata, ao mandar executar, da noite para o dia, a cobrança de precatórios de Alagoas, Guarulhos, Osasco, Pernambuco e Santa Catarina no valor que hoje chega a R$ 1 bilhão. Esses títulos foram federalizados pelo governo FHC e assumidos pelo governador Jaime Lerner, pressionado pelo Banco Central.

Multa mensal - Uma sentença do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, e outra decisão do Tribunal de Justiça do Estado, foram favoráveis ao Governo do Paraná, mas uma nova decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região determinou a manutenção do contrato das contas do Estado com o Banco Itaú. Com isso, o Paraná está pagando uma multa mensal, aplicada pela Secretaria do Tesouro Nacional, no valor de R$ 7,5 milhões, sem contar a retenção de R$ 39,1 milhões do Fundo de Participação dos Estados desde dezembro de 2004. “Se prosseguir nesse ritmo, serão R$ 80 milhões por ano”, alerta Requião, que na última semana conversou com o presidente Lula, em Brasília, solicitando uma solução do Governo Federal. “Não se negocia o interesse público; cumpre-se a Constituição”, justifica o governador.

Corrupção - O secretário Reinhold Stephanes, do Planejamento, iniciou sua exposição lembrando que acompanhou de perto a privatização do Banestado, pois foi indicado para comandar o processo de saneamento do banco antes de sua venda. Segundo ele, de 1995 a 1998 foi o período que concentrou a grande parte das irregularidades no banco, época em que também começaram a vir a público as dificuldades financeiras da instituição. “Mais da metade das operações financeiras realizadas entre 1995 e 1998 eram irregulares e boa parte apresentava altos indícios de corrupção”, revela.

Entre os vários exemplos de irregularidades constatadas, Stephanes cita o desvio de mais de R$ 300 milhões do Banestado Leasing para empréstimos a grupos políticos de Sergipe e a grupos frotistas, sem garantia. Ele também lembra de recursos para a construção de um shopping no interior do Estado cuja garantia era o próprio shopping, tudo sem contrato registrado. “Uma grande loja nacional de departamentos recebeu empréstimo de R$ 35 milhões quando o Banestado já estava em processo de pré-falência”, denuncia o secretário do Planejamento.

Precatórios - Quanto aos precatórios, Stephanes lembra que a Secretaria do Tesouro Nacional, o Banco Central e o Senado aprovaram que Guarulhos, Osasco, Pernambuco, Alagoas e Santa Catarina emitissem esses títulos para o pagamento de dívidas e o Banestado, que já estava em processo de pré-falência, teve que adquiri-los no valor de R$ 500 milhões. Assim, o Paraná teve que assumir esses precatórios com a promessa de pagar ao Banestado, dando ações da Copel como garantia, mesmo sabendo que o Estado não poderia honrar esse compromisso.

Hoje, os títulos valem R$ 1 bilhão. Alagoas fez um acordo com o Governo Lerner e pagou R$ 170 milhões, mas o Paraná ficou devendo para o Itaú o valor de face mais as taxas que incidiam sobre ele.

“O Paraná não pode honrar essa dívida, quer pelo histórico do caso, quer pelo volume dessa dívida, quer pelas ações judiciais que estão tramitando”, afirma Stephanes. Segundo ele, a solução é simples e técnica, podendo ser negociada pela Secretaria do Tesouro Nacional, pela Secretaria de Fazenda do Estado e todos os demais envolvidos.

Contas CC5 - Durante seu relato, Stephanes lembrou que outras duas preocupações na época eram as chamadas contas CC5 e a abertura de contas fantasmas para lavagem de dinheiro. Os primeiros sinais de dificuldades financeiras do Banestado apareceram em 96, mas foram “maquiadas” no balanço do banco, conta o secretário, criticando o Banco Central pela falta de fiscalização.

A situação se agravou em 97, quando o Banestado começou a operar no interbancário e os prejuízos tornaram-se públicos. Foi quando começaram as negociações para a privatização. “O Banco Central impôs que o Governo do Estado injetasse 50% dos recursos necessários para recuperar o banco ou que a instituição fosse privatizada”, conta.

Má administração - Em junho de 1998 o Estado assinou o acordo de privatização, mas nem o Banco Central, nem o Ministério da Fazenda aceitavam que os administradores do Banestado permanecessem. Em janeiro de 1999, Stephanes recebeu a proposta para sanear o banco até que ficasse em condições de ser privatizado. Ele conta que em 1999 e no primeiro semestre de 2000 o banco deu lucro, o que leva à conclusão de que era mal administrado.

No processo de privatização, havia muitas instituições interessadas na compra, inclusive estrangeiras. “Nossa intenção era esperar um pouco mais para que pudéssemos obter ofertas melhores. No entanto, o Governo do Estado tinha pressa e tudo foi aprovado rapidamente”.

Escândalos - O secretário da Segurança Pública, Luiz Fernando Delazari, que na época atuava na Promotoria do Patrimônio Público, conta que investigou 20 operações da Banestado Leasing e descobriu uma série de irregularidades. Entre elas, um empréstimo no valor de US$ 4 milhões, sem garantia, a uma empresa que já tinha falência decretada.

O procurador-geral do Estado, Sérgio Botto de Lacerda, relata que a gestão do Banestado tornou-se desastrosa a partir da saída do governador Roberto Requião do Governo para concorrer ao Senado, em abril de 1994. O então presidente do Banco Central, Gustavo Franco, havia editado uma resolução que tornava o câmbio livre, sem fiscalização.

“O Banestado passou a se envolver em escândalos diários, que incluíam o Bando Del Paraná e as agências de Nova York e das Ilhas Caimã”, lembra. A situação obrigou o Congresso a editar uma lei contra a lavagem de dinheiro e o Banco Central foi obrigado a alterar a resolução anterior, tentando moralizar as operações de câmbio.

Inconstitucionalidade - O banco foi se deteriorando e a privatização tornou-se inevitável. “A União condicionou a liberação de recursos – de R$ 3,8 bilhões – para sanear o Banestado, ao encerramento das operações das agências das Ilhas Caimã, de Nova York e do Banco Del Paraná”, relembra o procurador. O banco acabou sendo vendido ao Itaú por R$ 1,4 bilhão, sendo que os critérios de avaliação são discutidos judicialmente até hoje.

Sobre a gestão das contas do Governo, Botto de Lacerda explica que, em janeiro de 2003, ao tomar posse, o governador Roberto Requião ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal sobre a gestão das contas pelo banco adquirente do Banestado. Também requereu a inconstitucionalidade de uma Medida Provisória editada por FHC, pela qual se considerava banco federal toda instituição financeira privada que adquirisse uma instituição pública. Até hoje não houve parecer.

Funbep - O procurador revelou, ainda, que recentemente tomou conhecimento de um passivo de R$ 300 milhões do Banestado para com a Fundação Banestado (Funbep) que não foi repassado pelo Itaú, como teria sido acordado. O secretário Reinhold Stephanes esclareceu que havia um déficit de R$ 600 milhões relativos a pensões e aposentadorias de ex-funcionários, e que R$ 300 milhões deveriam ser pagos pelo Itaú.

Segundo ele, os aposentados não precisam se preocupar porque continuarão recebendo seus proventos normalmente. “Os prejudicados”, afirma, “foram os seis mil funcionários demitidos que receberam apenas 1/3 do que tinham no fundo, deixando os outros 2/3”. Stephanes aconselha a esses ex-funcionários demitidos que recorram à justiça para receber o que falta.

Finalizando sua exposição, o procurador-geral do Estado afirmou que o que se quer é a responsabilização da União e do Banco Central pelo método utilizado na privatização, que rendeu um grande passivo ao Estado do Paraná.

Foto Julio Covello-SECS
AEN
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